Esse foi o primeiro livro que li do Neil Gaiman e eu não posso dizer que não fui avisada: me apaixonei! O Oceano no Fim do Caminho, publicado pela Editora Intrínseca em 2013, transporta o leitor para um mundo em que tudo é incrivelmente fantasioso e possível: a infância.
Enredo e Personagens
A história começa de trás pra frente, nosso protagonista – já na fase adulta – está voltando de um funeral e para espairecer um pouco a mente, ele resolve dar uma volta de carro e seguir por um outro caminho, um caminho que na verdade ele conhecia bem. Ele está nos arredores de onde passou a maior parte da infância (em Sussex, Inglaterra) e acaba indo parar no final da rua, na fazenda Hempstock, onde morava a única amiga que ele teve na infância: Lettie Hempstock. Ele então é recebido pela mãe da antiga amiga e em meio às suas memórias de infância ele busca rever o lago, atrás da fazenda, que um dia ela o havia convencido de ser um Oceano.
“As memórias de infância às vezes são encobertas e obscurecidas pelo que vem depois, como brinquedos antigos esquecidos no fundo do armário abarrotado de um adulto, mas nunca se perdem por completo”. (pág. 14)
A partir deste momento, o protagonista começa a refletir e se lembrar de memórias há muito esquecidas, lembranças de quarenta anos atrás, quando ele era apenas um garotinho de 7 anos de idade, introspectivo e solitário, que buscava consolo e abrigo na companhia de livros, histórias fantasiosas de outros mundos, um escape da realidade que o rodeava. Tudo começa a ruir quando, em uma fase de dificuldades financeiras, seus pais resolvem alugar seu quarto para um estranho, o minerador de opala, e este acaba se suicidando no carro dos pais algum tempo depois. É neste momento que o garotinho encontra um refúgio seguro na fazenda Hempstock e principalmente na neta da família, Lettie Hempstock, que rapidamente se torna sua melhor amiga e protetora.
“Vou dizer uma coisa importante pra você. Os adultos também não se parecem com adultos por dentro. Por fora, são grandes e desatenciosos e sempre sabem o que estão fazendo. Por dentro, eles se parecem com o que sempre foram. Com o que eram quando tinham a sua idade. A verdade é que não existem adultos. Nenhum, no mundo inteirinho.” (pág. 130)
Toda a história é narrada pelo próprio protagonista através de suas memórias e lembranças, assim como sua visão de mundo naquela época. Na percepção do garotinho, coisas misteriosas e extraordinárias acontecem nos arredores da fazenda Hempstock e, ele e sua família estão correndo grande perigo, em especial pela chegada de um ser maligno chamado Ursula Monkton, que foi contratada pelos pais do menino para cuidar dele e da irmã quando sua mãe consegue um novo emprego. O garoto e Lettie então lutam durante todo o livro para escapar das garras de Ursula e tentar derrota-la, o que parece uma tarefa quase impossível considerando que todos parecem estar cegos de amores pela nova governanta, até mesmo – e especialmente – seu pai e sua irmã estavam encantados pela jovem e bela inquilina.
Minhas Impressões
O livro é um literalmente um “mergulho” em memórias e lembranças infantis, onde a linha tênue entre a realidade e fantasia se chocam e não sabemos ao certo onde uma coisa começa e a outra termina. A mente de um menininho de 7 anos, tímido, solitário e apaixonado por livros, é um verdadeiro mar aberto – ou melhor dizendo, um Oceano – sem limites para a criatividade, onde tudo pode acontecer. E de fato acontece. A história nos parece tão verdadeira que chegamos a temer pelo menininho e torcer para que a vilã seja derrotada ao final do livro.
Nas páginas dessa história encantadora sobre amizade e lealdade, vamos nos aproximando aos poucos do protagonista e entendendo as raízes dos seus medos e inseguranças, pois nenhuma fantasia ou ilusão é construída do nada, há sempre algo por trás, uma motivação. Esse é o primeiro livro que leio do Gaiman e fiquei completamente apaixonada por sua escrita, por como ele conseguiu me transportar para dentro da mente e das fantasias de seu protagonista, e de como eu me apeguei a ele durante essas 206 páginas. Tem muitas pontas soltas nesse livro, eu sei, mas eu o apreciei por completo, sem precisar de mais delongas – no entanto apreciaria muito se tivesse mais algumas páginas, hehe. Recomendo muito a leitura de O Oceano no Fim do Caminho, deixem-se levar e viajar para suas próprias memórias infantis e recordar-se de como era sua percepção de mundo quando sua mente ainda não tinha limitações.
“Fui para outro lugar em minha cabeça, para dentro de um livro. Era para onde eu ia sempre que a vida real ficava muito difícil ou muito inflexível”. (pág. 72)