Há algum tempo fui convidada pela DarkSide Books para elaborar algumas perguntinhas para a autora Ilana Casoy. Imaginem como eu fiquei empolgada com esse convite, adoro os livros dela e já comecei a pensar em várias perguntinhas. Após ter lido os dois livros do box Arquivos Serial Killers (foto acima) haviam várias coisas que eu gostaria de perguntá-la se pudesse e lá estava a oportunidade perfeita. Espero matar a curiosidade de vocês também.
Tem resenha em vídeo de Serial Killers Louco ou Cruel e Serial Killers Made in Brazil no canal.
Entrevista
1. Você sempre se imaginou trabalhando nessa área ou não foi algo que você planejou? Era o que você imaginava que seria ou você se deparou com situações que mudaram suas perspectivas ou te frustraram em algum momento?
Bom, eu já virei do avesso, já desvirei, já não sei mais o que que é certo. Claro que desde as mudanças mais básicas, por exemplo, quando eu comecei, meu primeiro campo de estudo foi a psiquiatria forense, porque eu achava que tinha uma resposta genética, uma coisa que a gente ia encontrar, um exame que ia fazer… e com os anos, tá longe de uma resposta só, você tem sempre uma equação bio, psico, sócio e o que mais couber. Hoje eu tenho muito mais perguntas do eu tinha quando eu comecei, só aumentei o número de perguntas. Quanto mais resposta eu tenho, mais pergunta brota.
2. Todo leitor tem curiosidade em saber quais foram as motivações dos autores ao escreverem seus livros. Conte-nos um pouco sobre sua primeira experiência como escritora e quais foram suas motivações para começar a escrever.
Na verdade, é assim. A minha primeira motivação pra escrever foi aprender a escrever. Do dia que eu aprendi a escrever, eu comecei a escrever. Gosto de escrever, independente se isso ia ser profissão, não ia ser profissão, tenho escritos desde sempre. Então, quando eu tirei um ano sabático pra fazer uma coisa que eu gostava, era o óbvio escrever. Foi isso que eu te falei, não era um plano, era o óbvio. Nossa, escrever. E aí eu tinha que escolher um assunto que eu gostasse, e eu já gostava desse assunto porque sempre me intrigou o “baseado em fatos reais”. Porque eu sempre quero entender qual que é o real e qual que é a ficção. Quando a gente pode, pela internet, entrar nos arquivos, nos livros, nos processos. Por exemplo, nos Estados Unidos, todo mundo que é condenado à morte, obrigatoriamente tem apelação. Eu li o processo inteiro do Ted Bundy. Olha, isso é uma oportunidade. Eu queria saber quais eram os fatos reais, quais não eram, daí eu soube direitinho o quê que era do processo, o quê que não era. Então foi assim, acho que a curiosidade mesmo é o que me move e sempre ter gostado de escrever. Quem gosta de jogar futebol… os caras tarados pelo futebol, o que eles vão fazer sábado e domingo? O que eles gostariam de fazer? Jogar! Eu tenho um monte de amigos aficionados por vídeo game. E eu escrevo, né? Então escrevo… não escrevo só crime, isso aí eu publiquei. Eu escrevo poesia. As vezes no Facebook sai alguma frase mais doce ou desse outro lado meu, já tenho até uma amiga que fala: “Eu to colecionando um monte de frase ‘e se’ aqui de Ilana Casoy”, e eu falei: “Beleza, vai, coleciona.” São coisas que saem naturalmente, que não são carreira. Escrever é interativo. Quando eu escrevo, eu exorcizo o caso de mim. Então lamento que eu não tenha mais tempo pra escrever, porque eu viveria melhor se já eu tivesse escrito sobre todos os casos que eu já trabalhei, né. Isso pode liberar espaço na cabeça e no coração, porque pesa.
3. Um assunto que está em voga é a redução da maioridade penal. Você, que teve oportunidade de conhecer inúmeros criminosos, muitos dos quais tinham histórico problemático familiar ou criminal desde a adolescência, teria uma opinião sua sobre a redução da maioridade penal que possa compartilhar conosco?
Eu sou totalmente contra a redução da maioridade penal, principalmente porque ela não resolve o problema de ninguém, exceto de quem se elege com o discurso. Ela nunca diminuiu criminalidade, é uma decisão, você tem que decidir uma linha divisória, e acho que no Brasil você tem problemas seríssimos pra abaixar essa linha. Não acho que cabe a discussão se você entende ou não entende, a questão não é essa. A questão é você tirar a chance, pra baixo daquela idade o indivíduo ainda tem chance, ele tá sendo apartado. Ele não tá na faculdade do crime, ele não tá em idade de faculdade ainda. Então ele ainda tem uma possibilidade de você resgatar esse jovem. Quanto mais cedo você jogar ele na cadeia, que é a grande escola… ali realmente o contato vai fazer a diferença. E não diminui a criminalidade. E assim, o menor é o peixinho, gente, vamos lá. Só pra te completar, pra você ter uma ideia, menos de dois por cento, aqui em São Paulo, dos menores da Fundação Casa, cometeram homicídio. Os outros noventa e oito, é roubo, furto, tráfico, então não entendi. Você vai pegar o ‘crime da dentista’ e fazer a bandeira da redução da maioridade penal, isso é representativo do jovem? Não, vamos pegar a estatística. Quantos jovens presos cometeram homicídio? Menos de dois por cento, então não pode ser, porque você pega os crimes brutais e elenca isso como motivo pra reduzir, porque também é errado. A maioria… enorme massa de jovens que comete crime, não são crimes contra a vida, são outros tipos de crimes. Se você pegar na adolescência, todo adolescente tem problema, gente, tá pra nascer… então, todo mundo no seu histórico… você não pode usar uma bola de cristal. “Ah, já sei, quem teve esse, esse e esse problema vai ser criminoso.” Não tem, não temos isso. Estatística também é uma coisa muito perigosa. Tinha um psiquiatra amigo meu, ele já morreu, ele falava assim: “Ó, cuidado com a estatística, porque se você entra numa cadeia você pode chegar à conclusão que usar chinelo de dedo leva ao crime, porque cem por cento de quem cometeu crime tá usando lá dentro.” Então tem que tomar um pouco de cuidado, né. “Ah, quem foi abusado na infância vai abusar.” Não sei gente, tem gente que foi abusada na infância e resgata criança na rua que tá sofrendo abuso. Aí nós vamos discutir mais pra frente que eu te preparei uma resposta sobre resiliência que eu vou tocar nesse assunto com você.
4. Após ter pesquisado e entrevistado cara a cara criminosos tão inescrupulosos, como o Marcelo (Vampiro de Niterói), você em algum momento chegou a questionar a sua própria visão de mundo e humanidade?
Eu fiquei mais desiludida, principalmente porque eu peguei os três principais casos de família, por exemplo, que teve no Brasil. Eu escrevi um livro sobre o Richthofen, o caso Richthofen, ‘O Quinto Mandamento’, eu escrevi ‘A Prova É A Testemunha’, sobre o Nardoni, e estou escrevendo agora o… você sabe que com a Darkside a gente vai lançar o box família, né? São esses três casos super complexos, só que veja bem como é a história de vida. O primeiro eu acompanhei pela polícia científica, então tudo muito técnico, muito prova e tal. O segundo, eu acompanhei pela acusação. Agora, o terceiro, eu acompanhei pela defesa, porque eu sou convicta da inocência do júri. Isso foi muito doloroso, ele foi condenado numa votação de quatro a três, então o júri também tinha dúvida. Tá se pedindo que ele vá a novo júri, eu gostaria de assistir isso e participar da defesa dele, e perceber que esses dados foram de qualquer maneira, por exemplo, tanto se falou da prova pericial, do sapato na porta… eu que examinei essa prova pela defesa. Fui eu que examinei… que eu olho e vejo que quem atesta, nem é um médico, nem um radiologista, é um sapateiro… Nada contra o sapateiro, mas você não vai falar que você condenou esse rapaz… nove anos, saiu no Datena, no Marcelo Rezende, que ele, que a prova, o pé era dele na porta. Aí, pior que isso, no júri a gente entende que o sapateiro é o vizinho do perito. Vizinho. É decepcionante. Uma prova assinada por cinco peritos que não fosse uma verdade absoluta. Tanto é que quando chegou o vídeo… ah, pior, demorou para a defesa conseguir o vídeo lá da sola do sapato, como foi o chute e tal, que tinha um vídeo que ia ser apresentado ao júri e a gente queria ver o vídeo. Cara, quando eu vi o vídeo, eu tive um ataque de riso… você entende que a perícia trocou o pé direito pelo pé esquerdo no exame do sapato?! Eu não posso acreditar. Como assim, você tá provando que o pé esquerdo do sapato… você usou o pé esquerdo do sapato pra mostrar a marca do pé direito, não, isso é… desculpa, é ridículo. Eu fiquei desiludida, então eu tenho muitas desilusões de coisas. E quanto mais eu ajudo defesas… Eu ajudo acusações e tudo, mas no Brasil, é muito mais fácil ser acusação do que ser defesa. A defesa tem muita dificuldade, muita dificuldade. Por exemplo, na perícia não entra advogado, mas entra promotor, porque mesmo? Não entendi. A mídia só procura a acusação, a gente tem problemas. Por quê que a mídia procura a acusação? Porque os advogados, são centenas de milhares, mas o promotor não vai mudar, a mídia vai precisar daquele promotor para o outro caso de repercussão. Então a mídia, ela não pode ser muito pró defesa porque se aquele promotor for maltratado por aquele canal de tevê, no próximo caso de repercussão que cair na mão dele, que a gente tem uns promotores carimbados, né, sempre com caso importante, ele não dá entrevista. A defesa não, fica mudando de advogado, né. Então você vê como é complicado defesa no Brasil, eu acho muito difícil.
5. Ao escrever seus livros detalhando tantos crimes brutais, teve receio de ao difundir essas informações estar incentivando ou encorajando alguém a executar alguma barbárie?
Tem coisa que eu descrevo e tem informações que eu omito quando eu acho que elas podem ensinar, não incitar ou incentivar, isso eu acho uma enorme bobagem, porque aí a bíblia a gente tá perdido, vai ter que tirar a bíblia de circulação. Então, a bíblia é assim, tem muitos criminosos que se amparam nos ditos de Deus pra matar. Então não diria incentivar, eu diria que eu tomo cuidado na hora da prova, pra não ensinar. Por exemplo, um serial killer que eu ajudei a pegar, a investigação incluiu uma questão telefônica importante e que eu não divulgo. Todo mundo sabe que foi uma questão telefônica, mas eu não vou dar o passo a passo porque na medida que eu der o passo a passo, o bandido… você sabia que eu tenho leitor que tá na cadeia? Uma vez que eu fui na cadeia eu vi um livro pra autografar. Então, não dá pra você detalhar, porque você tá ensinando também. “Ó, eu peguei um assim”, e o outro que tá fazendo lá com o telefone: “Ah, agora eu não vou mais fazer isso.” A Suzane é minha leitora, por exemplo, Richthofen. Ela queimou meu livro depois, mas ela era minha leitora. Ela mandou até cartinha pra editora, não foi?! É, é louco, né. Eu sei que tem um cara importante, não sei quem é, nem se tá vivo ou morto, isso faz uns anos. Eu sou muito ligeira também, veio um cara pra mim e falou: “Eu trouxe um livro de um chefia aqui pra senhora fazer uma dedicatória”, e eu, muito ingênua falei: “Como é o nome?” Ai ele falou: “Pode dedicar a um amigo”, lógico. Não ia me falar um nome. Então precisa tomar um pouco de cuidado pra não ensinar como escapar, que é diferente do que incitar, ou incentivar, encorajar, que eu acho que não cabe.
6. A edição definitiva do Arquivos Serial Killers que foi publicada pela DarkSide Books em um box especial, por sinal maravilhoso, teve grande aceitação do público. Eu mesma tive vontade de conhecê-la pessoalmente e parabeniza-la pelo trabalho feito com tanta coragem e empenho. Como você lida com essa receptividade por parte dos leitores?
Bom, os leitores… eu respondo tudo, demora as vezes, porque eu sou muito solicitada. Como eu sou muito fácil, todo mundo pode falar comigo e todo mundo fala comigo. O que pode acontecer, é as vezes demorar pra responder… se eu ficar só respondendo as solicitações que eu tenho, Facebook, via minha página, via Crimes S/A, via site, eu não vou fazer outra coisa. Eu tento um pouco tirar do meu pessoal, muita gente quer conversar. “Ah, então vou entrar na página da Ilana, vou ficar amiga dela e nós vamos bater papo.” Não dá gente, é impossível. Não consigo falar com a minha mãe, com a minha irmã, com meus filhos, então fica difícil eu parar tudo pra responder uma entrevista dessa, por exemplo. Né, uma perguntinha dessa, você vê quanto tempo a gente debate, porque eu sei que alguém tá lendo isso e vai usar isso. Eu não posso ser inconsequente, responder numa frase, numa linha e deixar qualquer entendimento. Então na medida do tempo, eu sempre respondo. Tem gente mal-educada, que fala assim “Dá pra você me ajudar no meu TCC?” Eu mando a bibliografia, a pessoa me responde “Obrigado por nada.” Então tá, né. O quê que a pessoa imaginou, que nós vamos sentar, fazer um trabalho em grupo? Sabe, é complicado, você tem que tá minimamente… eu posso ajudar numa medida tal que seja real, acho que isso é o principal. Eu acho que o interesse é pelo mistério real, né. Não é ficção que a gente tá falando. Então é mistério e é real, você tem duas questões aí que são muito importantes e que eu acho que o meu leitor, o perfil do meu leitor é a curiosidade. Eu não definiria como uma idade ou uma profissão. Pessoas curiosas, interessadas na mente humana, no ser humano, são os meus leitores. Todos eles querem saber, de alguma forma, saber essas histórias… tem história que eu mesma escrevo e falo “Gente parece que eu tô num filme, vamos combinar?” Então eu acho que é o mistério real que interessa. Eu não tenho medo porque a minha curiosidade é maior que meu medo. Se o medo for maior eu não faço nada, entendeu?
É isso pessoal! Lembrando que essa entrevista foi transcrita de um áudio portanto a linguagem é informal, mas o conteúdo está na íntegra. A Ilana foi muito solícita em tirar um tempo para responder essas perguntinhas e eu agradeço muito a atenção dela (além de ter sido incrível poder dar um abraço nela no evento Caveira Talk Show da DarkSide Books esse ano! ♥). Espero que tenham gostado e boa sorte no sorteio de 01 box Arquivos Serial Killers logo abaixo!
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Publicação: DarkSide Books
ISBN: 9788566636291 | 9788566636284
Gênero: Não-Ficção | Crime
Páginas: 360 | 360
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